Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconhece a competência do CEREST na fiscalização de normas de saúde e segurança do trabalho

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) deu provimento ao recurso de revista interposto pelo Ministério Público do Trabalho, proferindo decisão judicial que declara a competência do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) para fiscalizar e autuar empresas pelo descumprimento de normas de saúde e segurança do trabalho.

O acórdão foi proferido nos autos de uma ação anulatória ajuizada em 2012 pela empresa Pirelli Pneus Ltda. em face do Município de Campinas.

A ação proposta pela multinacional italiana pede a suspensão dos efeitos de multa administrativa lavrada pela autoridade sanitária municipal, em razão da não abertura de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) em benefício de um empregado acometido de moléstia decorrente do trabalho.

A empresa alegou que o CEREST Campinas não é competente para dispor sobre “direito, organização, manutenção e inspeção do trabalho”, sendo tais atribuições exclusivas da União Federal.

Em decisão anterior, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) deu provimento ao recurso ordinário interposto pela Pirelli, declarando a nulidade do auto de infração. O acórdão reconheceu a incompetência do CEREST para fiscalização do cumprimento de normas de saúde e segurança do trabalho, entendendo que não é cabível a nenhum órgão municipal a imposição de penalidades pela infração de normas laborais.

O Ministério Público do Trabalho interpôs recurso de revista ao TST, fundamentando que há competência do Sistema Único de Saúde (SUS) para a execução de ações fiscalizatórias em prol da saúde do trabalhador, o que confere validade ao auto de infração lavrado pelo CEREST Campinas– órgão integrante do SUS.

Os fundamentos apresentados encontram base no artigo 200 da Constituição Federal e no artigo 6 da Lei 8.080/90.

O MPT também defendeu, na peça recursal, que as autoridades de saúde local, mais próximas da realidade da população e das empresas, bem como das “condições históricas, sociais e econômicas da comunidade”, devem estar sempre atentas ao cumprimento de normas de proteção à saúde, incluindo do trabalhador.

Por unanimidade, os ministros da Segunda Turma do TST deram provimento ao recurso interposto pelo MPT, determinando o retorno dos autos ao TRT-15 para que prossiga na análise dos demais temas do recurso ordinário interposto pela Pirelli.

A ministra Delaíde Miranda Arantes foi a relatora do acórdão.

Opinião do especialista

Embora o STF (Supremo Tribunal Federal) tenha deliberado, que o Cerest (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador) detém  competência para fiscalizar e penalizar empresas que descumprem regras e leis de Segurança e de Medicina do Trabalho, não há legislação específica que dê competências ao órgão para atuar em empresas.

Quem chama a atenção é o Advogado Dr. Eder Daré. O tema vem gerando polêmica por se tratar, de acordo com especialistas, de uma violação à Constituição Federal. A lei de 1988 atribui à União a competência exclusiva para organizar, manter e executar a inspeção do trabalho, o que consiste em fiscalizar irregularidades praticadas por inobservância das normas de segurança do trabalho.

Além disso, de acordo com Daré, em sua decisão, a Ministra Delaíde Miranda Arantes, e o Ministro Dias Toffoli fundamentaram nos artigos 154 e 159 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), além do estabelecido no art. 1º da Lei Federal nº 9.782/1999.

A discussão, para o especialista, não diz respeito à inquestionável competência dos profissionais que constituem os Cerests, mas é de ordem jurídica. “Ocorre que tais dispositivos não validam a decisão dos ministros, pois sequer versam sobre as competências dos Cerests, previstas nas regras do próprio Ministério da Saúde, em especial a Portaria nº 1.679/2002, cujo texto está na Portaria de Consolidação nº 03/2017”, justificou. Conforme a referida portaria, os Cerests têm o papel de prover retaguarda técnica especializada para o conjunto de ações e serviços da rede SUS (Sistema Único de Saúde). 

Entre as funções do órgão, estão fornecer retaguarda técnica especializada para o conjunto de ações e serviços da rede SUS; recolher, sistematizar e difundir informações de interesse para a saúde do trabalhador; apoiar a realização das ações de vigilância; e facilitar os processos de capacitação e educação permanente para os profissionais e técnicos da rede do SUS e dos participantes do controle social.

Os Centros também têm competência para notificar compulsoriamente os órgãos de saúde quando algum ambiente de trabalho expõe os trabalhadores a algumas doenças e prestar assistência médica para recuperação de pacientes que possuam doenças oriundas do exercício laboral.

Insegurança Jurídica

Para Daré, invalidar a competência dos Centros de Referência não impacta nos processos de fiscalização. “Importante destacar que as fiscalizações e autuações às empresas negligentes devem ocorrer. Isso é papel da União e não está em discussão. No entanto, em obediência ao princípio da legalidade, as regras para isso devem ser claras, como já são no caso do exercício dos auditores fiscais do trabalho”, chama a atenção. 

Caso estes autos de infração comecem a acontecer em grande escala, o especialista faz alguns questionamentos: como e para quem as empresas autuadas devem recorrer? Com quais prazos? Quem serão os julgadores dos recursos?

Essas e outras questões processuais precisam estar bem detalhadas em alguma legislação que discipline essa matéria. Hoje, referente aos Cerests, essa legislação não existe. E qual a principal consequência disso? A meu ver, aumenta-se a insegurança jurídica para as organizações, alerta. 

O advogado ainda comenta sobre a preparação dos profissionais do Cerest para esta nova demanda, já que não foram treinados para fazer autuação às empresas. Caso essa decisão se mantenha, Daré afirma ainda que uma nova regulamentação precisa surgir para disciplinar essa matéria. “Seria necessário o treinamento dos profissionais dos Cerests para que possam, não só confeccionar os autos de infração, mas também instruir corretamente esses processos administrativos, de forma a manter o direito à ampla defesa e contraditório das empresas eventualmente autuadas”, conclui. 

Fonte: Suporte Gestão Seg & Company – em 25/01/2024.